Monday, March 31, 2008


Sensibilidade e bom senso

Também há mais ou menos 12 anos (deve ser um daqueles ciclos astrológicos importantes de que falam os entendidos), uma rapariga foi a uma entrevista de emprego, numa grande instituição de crédito mundial. Passou a fase da entrevista de grupo e reuniu-se individualmente com o possível futuro chefe. Este era um tipo novo, de cabelo claro muito curtinho, postura e coloração facial Red Bull. Apresentou-se como sendo alguém que gostava tanto daquilo que fazia que até a mulher lhe dizia que ele gostava mais daquilo do que do filho que ia nascer. She pitied him immediately. A entrevista correu bem, até à derradeira pergunta: "Se algum dos seus colaboradores cometesse um erro gravíssimo, que acarretaria um prejuízo de milhões, o que é que faria?". Ela pensou uns segundos e respondeu: "Iria averiguar o que esteve na origem do erro, e se verificasse que a pessoa tinha sido cuidadosa mas mesmo assim tivesse sido um lapso não intencional, perdoar-lhe-ia". "Perdoaria um erro de milhões?", ripostou ele incrédulo. "Sim", disse ela. "Porque uma pessoa que errou e foi perdoada, no futuro será provavelmente mais empenhada, mais atenta, e por estar grata, muito mais motivada". Ele abanou a cabeça, consternado. Ela sorriu. Não queria aquele emprego.

Fábrica dos Sonhos

Em Xabregas há um "centro cultural" com encanto. Onde havia uma fábrica de armamento, agora há uma fábrica de sonhos. E na fábrica dos sonhos, já cantava o artista, podes ser quem tu queres, ninguém te leva a mal.
Há 3 bares acolhedores, uma bela livraria, salas misteriosas com exposições, aulas de sapateado (e outras), uma música de piano que vem de uma porta fechada. Os empregados são afáveis e têm "imensos chás". Há intelectuais, crianças, estrangeiros e de vez em quando, gente normal.

Dois quarteirões ao lado, numa sociedade recreativa de truz, dançava-se o bailarico vespertino com lamés e sapatos engraxados a rigor.

Xabregas pode bem ser a next big thing.

Friday, March 28, 2008

Em Belém

Ontem, depois de aviar uma pita shoarma crocante vegetariana com a minha amiga Anabela, fui ver uma peça de teatro amador ao Centro Cultural da Casa Pia. Um texto de estrutura simples, imaginativo e fluido, actores compenetrados e personagens patuscas, trouxeram boa disposição ao final do dia dos amigos e conhecidos do elenco, ainda em farpelas de trabalho, que enchiam a plateia. Parabéns ao Oliveira & sus muchachos!

Thursday, March 27, 2008

Peluche

Há mais de 12 anos, uma rapariga zangou-se com o namorado porque ele tinha dito que a colega de casa dela era mais bonita do que ela.
No dia seguinte, a senhoria da casa onde ela vivia, num quarto alugado, chamou-a com o seu sorriso de velhota. Ele esperava à entrada com um peluche gigantesco debaixo do braço para lhe dar. Ele nunca fora de dar peluches. Ele sempre fora demasiado forreta para oferecer fosse o que fosse com aquele tamanho. Ele correra a cidade toda à procura do peluche que representasse o peculiar animal que ele lhe tinha atribuído como alcunha (como deve ter desejado ter-lhe antes chamado ursinha, tão mais fácil de encontrar!). Vinha esbaforido, suado, envergonhado.
Ele saíra do seu casulo de conforto, expusera-se ao ridículo e ali estava, pedindo perdão.
E ela perdoou-lhe.
Não viveram felizes para sempre, mas ela ainda guarda o peluche e ele ainda guarda a recordação do que foi capaz de fazer por amor.

Os garotos propaganda

Ontem os suecos da nova música do anúncio da Optimus foram tocar à Aula Magna.
(A Optimus parece empenhada em promover concertos value-for-money, porque antes dos aguardados ainda se ouviu o estafado Bruno Nogueira com as rábulas do costume, e um concerto simpático mas ligeiramente soporífero da pernilonga Red Shoes.)
Desengonçados e ligeiramente caricatos, eram 4 rapazes e 1 rapariga, cujo tipo físico ia do mendigo desdentado (com barrete sebento e tudo) ao lavradeirão de camisa aos quadrados, com um betinho de caracóis e um baterista careca pelo meio, acabando na lourinha que calçava sandálias robustas com meias. Mas assim que abriram as goelas e os instrumentos (que não eram os deles, porque esses estavam algures no aeroporto de Milão), mostraram que sabiam da música como ninguém.
As parecenças com os Cure ficaram para coincidência; tudo o resto era deles, e mesmo deles - voz perfeita, boas melodias, pop escorreita, energia a rodos (que pena o público tão frio e tão sentado).
No final do 1º acto, o vocalista irrompeu do palco e desatou a correr em frente, por cima das cadeiras das doutorais. Merecia uma multidão que o erguesse no ar, mas só dois garotos possuídos lhes faziam as honras (é o mal de encher concertos com convidados). A turbamulta já eufórica estava toda cá atrás, tolhida pela barreira de separação.
Melhores do que no anúncio, digo-vos eu: Shout Out Louds.

Wednesday, March 26, 2008

Decidam-se

De acordo com uma teoria, pessoas com alta auto-estima sofrem mais desilusões amorosas do que pessoas com baixa auto-estima, porque se intrigam e indignam mais com o facto de alguém poder manifestar desinteresse ou desamor por elas.
Já nem ter auto-estima compensa?

Ser impopular

  • Acordar cedo.
  • Gostar pouco de sair à noite.
  • Não fumar ganzas.
  • Desdenhar das marcas.
  • Nunca ter jogado Playstation.
  • Ignorar os gadgets.
  • Gostar de pessoas mais do que de sexo.
  • Ter prazer em comer.
  • Insistir em pagar a conta a um homem.
  • Achar que querer ir a Cuba durante a ditadura se compara ao desejo mórbido de ver humanos num zoológico.
  • Ser contra o aborto.
  • Relativizar a importância do trabalho.
  • Olhar para as crianças com desconfiança.
  • Ter medo do mar.
  • Resistir aos rótulos de "direita" e de "esquerda".
  • Estimar os entes amados, com zelo e afinco.
  • Pensar que os clientes da prostituição e do striptease são patéticos.
  • Aborrecer-se com a pompa e o hermetismo de palavras e actos do mundo académico.
  • Ser professora e nunca faltar às aulas.
  • Quase nunca ter uma gripe.
  • Irritar-se, até morrer, com quem se atrasa.
  • Preferir a montanha à praia.
  • Adorar trovoadas.
  • Lembrar-se dos aniversários.
  • Gostar de espanhóis.

Thursday, March 13, 2008

Era uma vez uns alcezinhos que tocavam bateria

Do Canadá vieram 4 rapazinhos clarinhos com ar lavadinho, que se postaram nos lugares sem uma palavra e principiaram a dar nos instrumentos como gente grande. O Caribou-mor volta e meia gorgolejava umas palavras em falsete, mas a estrela da companhia era o baterista, que, de ar esgazeado, boca aberta e a expressão de quem estava prestes a ter um orgasmo durante o concerto inteiro, malhava no ferro sem cerimónias. Quando o lourinho da esquerda se lhe juntava no mais perfeito uníssono de baterias já ouvido (se é que tal coisa existia antes), percebia-se que aquela era uma banda de duas baterias fulminantes. Os outros das cordas lá atrás eram esquecidos. Por vezes, os alcezinhos furiosos sustinham-se para o Manitoba ir tocar um xilofone ou um pifarinho, logo voltando, impacientes, às suas amadas baterias. Depois foram-se sossegados como se pisassem neve.

Friday, March 07, 2008

Metro

Pûs-me à fofoca na mercearia do bairro e consta que o hiper que há neste momento à frente da minha casa vai converter-se numa saída de metro. Poderei vir a ser, além de uma cidadã sortuda, uma investidora cheia de potencial.

A Carochinha

Quando eu era pequenina, a minha mãe pôs-me a alcunha de Carochinha. A Carochinha era aquela que tinha ficado rica e dizia que era bonitinha e perfeitinha e boazinha aos pretendentes que passavam. Fez-se esquisita e rejeitou uma data deles, e por fim houve um que lhe serviu, mas que por ser guloso e cusco morreu dentro de um caldeirão. De modo que ela não chegou a casar (ficou só rica).
Há quem diga que os nomes que se dá às pessoas lhes condicionam a vida. Não sei onde a minha mãe tinha a ideia :)

Wednesday, March 05, 2008